Proteção duvidosa

Farol fechado. Alguém se aproxima do carro, bate no vidro com o cano de um revólver. Pode ser tentativa de assalto, seqüestro relâmpago ou o roubo do veículo, ameaça que é motivo de paranóia para quem dirige em grandes cidades. Blindar o carro, para muitos, é garantia de proteção contra uma abordagem violenta. Pode parecer, mas não é bem assim.

Com 8 mil a 12 mil unidades, o Brasil teria hoje a terceira frota de carros blindados do mundo, atrás de Colômbia e México, segundo fontes do mercado. O medo da violência, apurou a Fundação Getúlio Vargas (SP), movimenta no País, por ano, R$ 6,5 bilhões em blindagem de veículos. Perto de 50 empresas atuam no setor.

Blindar um carro custa de R$ 25 mil a R$ 70 mil. Mais do que a despesa, no entanto, dirigir um carro protegido implica mudança de atitude do motorista. O ideal é que o condutor faça um curso de direção defensiva (leia no destaque). “Dirigir um carro desses sem ter conhecimento técnico é o mesmo que tentar usar uma arma sem ser habilitado em um curso de tiro”, compara um policial paulista, especialista em armas, que preferiu ficar anônimo.

A polícia não tem estatísticas sobre assaltos contra carros blindados. Mas um dado de Manoel Camassa, titular da 4a Divecar, delegacia paulista que combate o roubo de veículos, serve de reflexão para quem confia toda a sua proteção à blindagem. Segundo ele, 90% das vítimas de roubo à mão armada são abordadas ao entrar ou sair do veículo, momento em que a blindagem não faz a menor diferença. Já nas tentativas de assalto em semáforos, a chance do ocupante do automóvel reforçado sair ileso é 85% superior, se comparada à de pessoas sem essa proteção.

Como o País não tem uma norma para o setor, há empresas que adotam os critérios técnicos alemães de blindagem, enquanto outras seguem padrões dos EUA. Entre uns e outros, o consumidor tem uma vaga idéia do que está comprando, principalmente se o blindado for usado.

Credibilidade questionada
O pior, em um mercado em que se promete muita segurança e oferece pouca informação, é que algumas empresas acusam as concorrentes de não obedecer critérios técnicos na execução do serviço. “As normas não determinam onde o carro deve receber a proteção, mas o nível de segurança que o material da blindagem deve oferecer”, explica Franco Giaffone, diretor da G5. Sua empresa é certificada pela Bullet Resistent Veychle, norma em que se enquadram os carros blindados por Audi, Mercedes e BMW. Ainda que a matéria-prima usada seja de primeira, afirma Giaffone, falhas no projeto podem deixar espaços desprotegidos.

Rogério Garrubo, sócio-diretor da Safety Life, concorda com Giaffone. “É comum vermos carros sem blindagem em pontos críticos, como as colunas das portas.” Garrubo conta o caso de um cliente que queria trocar o vidro de um Daewoo Prince, supostamente blindado. Ao desmontar as forrações das portas, os técnicos descobriram que o carro, comprado por R$ 30 mil, não tinha manta de proteção. O pára-brisa só havia recebido camadas de película plástica para ficar menos vulnerável a uma tentativa de arrombamento.

Marcelo Carneiro, diretor comercial da Central de Blindados, em São Paulo, confirma a existência do que ele chama de veículos malblindados, principalmente com problemas estruturais. Ao verificar o Cherokee de um cliente, Carneiro constatou que suas vigas foram cortadas para permitir a instalação da proteção balística. Essa prática compromete a segurança na eventualidade de uma capotagem: “O motorista escapa de morrer à bala e corre o risco de não sobreviver a um acidente grave”, explica Carneiro. O Jeep, comprado como se tivesse proteção total, também não dispunha de blindagem nas fechaduras e no teto.

Para comprar esse tipo de carro, o consumidor deve procurar lojas idôneas, que se responsabilizem pela qualidade dos automóveis que vendem e não sejam simples revendedores de veículos. Nesse caso, valem referências de amigos ou parentes. Também é importante exigir, sempre, o contrato e o certificado de blindagem, documentos que as empresas do setor devem emitir quando fazem alguma adaptação em veículos. Esse contrato deve detalhar todas as alterações que o carro sofreu, bem como o nível de segurança oferecido para cada parte. No caso dos usados, as blindadoras podem emitir segunda via do documento se o original foi extraviado.

“Se não tiver certificado de blindagem, não compro”, garante Joaquim Neto, gerente comercial da Fórmula Blindados, concessionário Inbra. Além de blindar veículos, a empresa vende usados produzidos por outras empresas. Segundo Neto, o certificado é essencial. Ele ainda afirma que não negocia carros de algumas blindadoras, mas nega-se a informar seus nomes por motivos éticos. “Confiar unicamente no nome do fabricante pode ser o maior furo n’água”, afirma Garrubo, da Safety Life.

A manutenção de um blindado exige mais atenção que a dispensada a um carro comum. Empresários do setor garantem que os materiais utilizados na blindagem têm durabilidade indefinida. Mas, devido ao peso extra (de 100 a 400 quilos, dependendo do nível de segurança), alguns componentes do veículo podem sofrer desgaste prematuro.

“As máquinas dos vidros, os sistemas de freio e suspensão, o estado dos pneus e da fixação das portas devem ser verificados periodicamente”, enumera Giaffone. Para ele, a perda de desempenho de um carro blindado não é muito grande e varia com o tipo de proteção instalado. “É possível ter uma idéia das respostas do carro imaginando que ele rode sempre com mais duas pessoas de 80 quilos”, exemplifica.

O raciocínio é compartilhado por André Veronezi, gerente de Veículos Especiais para a América Latina da Volvo. “O peso da blindagem de uma perua V40 T4 é de 142 quilos, equivalente ao de dois adultos.” Segundo ele, a perua, com motor de 200 cavalos, tem as mesmas respostas, blindada ou não. O modelo custa pouco mais de R$ 104 mil na versão básica e cerca de R$ 175 mil, com o nível máximo de blindagem.

Por esses valores, soa pretensioso sugerir que a classe média já pode recorrer à blindagem. A proteção extra custa, no mínimo, o preço de um carro médio. João Carlos Bourg, diretor-adjunto de vendas da Fiat, anuncia que a rede está vendendo a versão blindada do Brava por cerca de R$ 70 mil, com garantia. Só que, nesse caso, os 100 quilos a mais aplicados ao carro pela Inbra não pesam apenas no orçamento. A perda de desempenho e o aumento do consumo são calculados pela área técnica da montadora em 7% a 10%.

Fonte: Autoesporte

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